Do estado de direito social ao estado de direito da natureza?

A questão da personalidade jurídica de entes naturais não humanos

  • Joaquim Sabino Rogério Universidade Lusófona
Palavras-chave: Pessoa, Personalidade Jurídica, Pachamama, Contrato Natural, Ecologia, Ambiente, Antropoceno

Resumo

O artigo começa por percorrer caminhos já muito trilhados acerca do significado de pessoa, sua origem etimológica e desenvolvimento histórico e o advento e alcance do instituto da personalidade jurídica. Depois enuncia vários casos de atribuição, no presente século, de personalidade jurídica a entidades naturais não humanas, seja com base em cosmovisões naturalistas/animistas ou na ideia de um contrato natural, e como único modo de salvar o planeta nesta época de Antropoceno. A partir daí, o artigo desenvolve toda uma argumentação contra este caminho e sustenta que um estado de direito social e ambiental/ecológico, de fundamentação antropocêntrica, assente nos deveres e numa ética da responsabilidade, dialógica e de cuidado, é a resposta a uma tutela adequada do ambiente e da natureza, ao mesmo tempo que demonstra que o recurso à inovação da atribuição de personalidade jurídica aos entes naturais não humanos nada acrescenta ao que se vai realizando atualmente no plano dos discursos, das normas e das instituições jurídicas, em termos preventivos e repressivos.

 

Downloads

Não há dados estatísticos.

Referências

BOBBIO, Norberto, A Era dos Direitos, Rio de Janeiro: Editora Campus/Elsevier, 2004.

CAYGIL, Howard Caygil, “ Humanidade”, in Dicionário Kant, BlackWell Pub., 1995, p. 174.

CANOTILHO, José Joaquim Gomes, “O direito ao ambiente como direito subjetivo”, A Tutela Jurídica do Meio Ambiente: Presente e Futuro, Studia Jurídica 81 (2005): Coimbra Editora, p. 47 – 57.

CARVALHO, Orlando de, “Para uma Teoria da Pessoa Humana”, in LIBERAL FERNANDES, Francisco, Guimarães, Maria Raquel, Redinha, Maria Regina (coord.), Orlando de Carvalho, Teoria Geral do Direito Civil, 3.ª Ed. Coimbra: Coimbra Editora, 2012., p. 247-267.

CASTANHEIRA NEVES, A., O Direito Hoje e com Que Sentido? O problema actual da autonomia do direito. Lisboa: Instituto Piaget, 2002.

CORDEIRO, António Menezes, Tratado de Direito Civil, IV (Parte Geral-Pessoas), 5.ª ed. revista e atualizada. Coimbra: Almedina, 2024.

CUTANDA, Blanca Lozano; RAMOS, A. García de Enterría Ramos, “La declaración del Mar Menor y su cuenca como persona jurídica: un «embrollo jurídico»” Diario La Ley 10163(4 de noviembre de 2022).

DÍAZ, Carlos, “Pessoa”, in Adela Cortina (dir.), 10 Palavras Chave em Ética. Navarra: Editorial Verbo Divino, ed. portuguesa da Gráfica de Coimbra (s/d), p. 281-318.
DIGGLE, J. at all. (eds), The Cambridge Greek-Englisn Lexicon. Cambridge, UK: University Printing House, 2021.

DUFAUR-DESSUS, Laurent, “Une insaisissabilité accentuée par la prise en compte du vivant au-delà de l'humain”, in: La personnalité juridique:réflexion sur le sujet de droit (Tese, Université de Pau et des Pays del’Adour, 2021), p. 158 – 189 https://theses.hal.science/tel-04625311v1/file/LDufaurDessusjuin2021.pdf.

FARIA COSTA, José de, “Sobre o objecto de protecção do Direito Penal: o lugar do bem jurídico em uma Teoria Integral do Direito Penal Liberal”, Direito Penal e Liberdade, 1.ª Ed. Lisboa: Âncora, 2020, p. 115 – 142;
______. Direito Penal, 1.ª Ed. Lisboa: INCM, 2017;
______. “Ilícito-típico, resultado e hermenêutica (ou o retorno à limpidez do essencial), in Maria da Conceição VALDÁGUA, coord., Problemas fundamentais de Direito Penal: Colóquio Internacional de Direito Penal em Homenagem a Claus Roxin. Lisboa: Universidade Lusíada Editora, 2002, pp. 27 – 40;
______. O Perigo em Direito Penal (Contributo para a sua fundamentação e compreensão dogmáticas). Reimpressão. Coimbra: Coimbra Editora, 2000.

FARIA COSTA, José de /MOURA Bruno de Oliveira, Filosofia do Direito, 2.ª Ed. Lisboa: Âncora, 2022.

FERNANDES, Francisco Liberal, Guimarães, Maria Raquel, Redinha, Maria Regina (coord.), Orlando de Carvalho, Teoria Geral do Direito Civil, 3.ª Ed. Coimbra: Coimbra Editora, 2012.

GARCIA, Maria da Glória, O Lugar do Direito na Protecção do Ambiente. Coimbra: Almedina, 2007.

GUERRA, José Armando Morais, Espacios naturales protegidos en el ordenamiento jurídico português, 1.ª Ed. Madrid, España, Colex Data/ Wolter Kluwer España, 2013.

GONÇALVES, Diogo Costa, Lições de Direitos de Personalidade – Dogmática Geral e Tutela Nuclear, 1.ª Ed. Cascais: Princípia, 2022.

HERMITTE, M. A., “Artificialisation des droits de la nature et droit(s) du vivant”, in Philippe Descola (Coord.) Les natures en question, coédition Odile Jacob/Collège de France, 2018, p. 257 - 284.

HOUSSET, Emmanuel, La vocation de la personne. L´histoire du concept de personne de sa naissance augustinienne à sa redécouverte phénoménologique. Paris: Épiméthée/PUF, 2007.

IMMANUEL KANT, “Dos motivos da razão pura prática”, Crítica da Razão Prática, livro I, cap. III, Coleção Grandes Filósofos. Lisboa: Edições 70, 2008.

JONAS, Hans, The Imperative of Responsibility. In Search of an Ethics for the Technological Age, London: The University of Chicago Press, Chicago & London, 1984.

______. Philosophical Exploration and Metaphysical Speculation, apud TOYA, Hiroshi, “Responsibility to Others in the Future”, Philosophy World Democracy, Jan. 2021, vol. 2. N.º 1, 29-40.


KITTEL, Gerhard, FRIEDRICH, Gerhard (eds), Theological Diccionary of the New Testament. Devon, UK: William B. Eerdmans Publishing Company/ The Paternoster Press, 1985.

LOCKE, J., “"Da identidade e da diversidade", in Ensaio sobre o entendimento humano, I, cap. XXVII, 5.ª Ed. portuguesa. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 2014.

MABBOT, J. D., John Locke, A. D. Woozley (General Editor), Philosophers in Perspective. London and Basingstoke: The Macmillan Press Ltd, 1973.

MACHADO, José Pedro, “Pessoa”, in Dicionário Etimológico da Língua Portuguesa, p. 355.

MAS, Silvia, “The Prosopological Reading of the Term πρόσωπον – persona in the Works of Origen and Tertullian”, in C. Rico, J. Paniello, From Logos to Person. Comparative Philosophy of Religion, vol. V. Springer, Cham. 2024, 159-172.

MATEO, Blanca Soro; CARREÑO, Santiago M. Álvarez, “Derechos de la naturaleza y Constitución, a propósito del caso de la laguna del Mar Menor, REAF-JSG 39 (junio 2024): 61-122, acessível em: https://raco.cat/index.php/REAF/issue/view/32336/1101.

MORI S.J., Geraldo Luiz de,“A trajetória do conceito de pessoa no Ocidente”, Theologica Xaveriana, vol. 64, n.º 177. Bogotá – Colômbia (Enero-Junio 2014): 59-98.

OST, François, “La personnalisation de la nature et ses alternatives”. Antoine Bailleux (ed.), Le droit en transition. Presses universitaires Saint-Louis Bruxelles, 2020, https://doi.org/10.4000/books.pusl.27200.
______. A Natureza à Margem da Lei. A Ecologia à Prova do Direito. Lisboa: Instituto Piaget, 1997.

PERELMAN, Chaïm, Ética e Direito. São Paulo: Martins Fontes, 2000 (reimpressão).

RADBRUCH, Gustavo, “A pessoa”, Filosofia do Direito 1.ª Ed. São Paulo: Martins Fontes, 2004.

REALE, Miguel, “A Pessoa como Valor Fonte”, in Filosofia do Direito, 20.ª ed. São Paulo: Saraiva, 2002.

REEVES, Hubert, Malicorne: Reflexões de um observador da natureza. 1ª Ed. Lisboa: Gradiva, 1990.

RICOEUR, Paul, “A ética, o político, a ecologia. Entrevista com Paul Ricoeur, conversa recolhida por Edith e Jean Paul Deléage”, Écologie politique, Sciences, Culture, Société, Verão de 1993, n.º7, acessível em:
https://www.uc.pt/fluc/uidief/textos_ricoeur/a_etica_o_politico_e_a_ecologia.

ROCHA PEREIRA, Maria Helena da, Estudos da Cultura Clássica, I Volume – Cultura Grega, 11.ª Ed. revista e atualizada. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian 2012.

SABINO ROGÉRIO, Joaquim “O crime de danos contra a natureza: um olhar para o artigo 278.º do Código Penal português à luz de uma conceção onto-antropológica do direito penal”, in: José de Faria Costa - Estudos por ocasião dos seus 75 anos. Lisboa: Edições Universitárias Lusófonas, 2025, p. 377 – 413.

SÁNCHEZ, Luis Pomed, “La atribución de personalidad jurídica a la laguna del Mar Menor y su cuenca: reflexiones al hilo de la Ley 19/2022, de 30 de septiembre, y la sentencia del Tribunal Constitucional 142/2024, de 20 de noviembre”, Revista Aranzadi de Derecho Ambiental, no 60 (Editorial Aranzadi, Enero de 2025).

SANTOS, Leonel Ribeiro dos, Kant: Posteridade e Actualidade. Colóquio Internacional. Centro de Filosofia da Universidade de Lisboa, 2007.

SERRES, Michel, O Contrato Natural. Lisboa: Piaget, 1994.

SOROMENHO-MARQUES, Viriato, “Etica da política e diplomacia ambientais: natureza, implicações e fundamentos”, Ética Aplicada. Ambiente. 1.ª ed. Lisboa: Edições 70, 2017, p. 107 – 128.

STONE, Christopher D., “Should Trees Have Standing? Revisited: How Far Will Law and Morals Reach? A Pluralist Perspective”, Southern California Law Review 59 (1985): 1 – 154;
______. “Should Trees Have Standing? – Toward Legal Rights For Natural Objects”, Southern California Law Review 45 (1972): 450 – 501.

SUPIOT, Alain, Homo Juridicus. Ensaio sobre a função antropológica do direito. Lisboa: Instituto Piaget, 2005.

TOYA, Hiroshi, “Responsibility to Others in the Future”, Philosophy World Democracy, Jan. 2021, vol. 2. N.º 1, 29-40.

VASCONCELOS, Pedro Pais de, Teoria Geral do Direito Civil, 6.ª Ed. Coimbra: Almedina, 2006.
Publicado
2025-11-26
Como Citar
Sabino Rogério, Joaquim. 2025. «Do Estado De Direito Social Ao Estado De Direito Da Natureza? A questão Da Personalidade jurídica De Entes Naturais não Humanos». De Legibus - Revista De Direito Da Universidade Lusófona Lisboa, n. 9 (Novembro), 35. https://doi.org/10.60543/dlb.vi8.10399.